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Creatina e Cognição: A nova dupla do momento ou ficção?

Brunno Falcão

4 min

2 de abr. de 2024

A suplementação de creatina ganhou prestígio na nutrição esportiva devido aos benefícios demonstrados, relacionados à musculação, aumento de carga, ganho de potência e aumento de massa muscular. Isso ocorre devido ao seu mecanismo de ação, que consiste basicamente no aumento da concentração de creatina livre e fosfocreatina no músculo esquelético.   Dessa forma, ela provoca alterações cruciais no organismo, como o aumento da ressíntese de ATP, a molécula energética do organismo. Nesse cenário, a creatina atua doando um fosfato para a molécula de ADP, transformando-a novamente em ATP (molécula rica em energia que fornecerá poder de força para o músculo).  Matérias mais recentes têm relacionado a suplementação de creatina com o desempenho cognitivo. Vejamos ao longo deste artigo o que a literatura nos diz a respeito desse tema. Suplementação de Creatina vs.  Níveis de Creatina no Cérebro A suplementação de creatina, conhecida por seus impactos positivos no desempenho físico, tem sido objeto de estudo em relação aos seus efeitos nos níveis de creatina no cérebro.  Enquanto o músculo depende principalmente da ingestão alimentar e da síntese endógena de órgãos como fígado, rins e pâncreas, o cérebro possui a capacidade de sintetizar creatina.  A presença de enzimas necessárias para essa síntese no sistema nervoso e transportadores de creatina na barreira hematoencefálica e células neurais sugere que a creatina cerebral pode ser influenciada tanto pela produção endógena quanto pela ingestão dietética. Surpreendentemente, a creatina cerebral parece não ser afetada pela ingestão habitual de alimentos, conforme evidenciado pela semelhança nos níveis de fosfocreatina (PCr) entre vegetarianos e onívoros.  Contudo, a literatura aponta que, em casos de distúrbios hereditários nas enzimas envolvidas na síntese de creatina, a suplementação dietética pode ser benéfica para aumentar as concentrações de creatina no cérebro. O envelhecimento é outro fator que se especula influenciar os níveis de creatina cerebral. Embora tenha sido sugerido que o envelhecimento poderia resultar em redução da atividade cerebral, depressão e outros fatores que afetam a creatina no cérebro, estudos indicam que os níveis de PCr cerebral são comparáveis entre idosos e jovens aparentemente saudáveis. A complexidade da relação entre esses fatores e a creatina cerebral destaca a necessidade de pesquisas mais aprofundadas. No entanto, a estratégia ideal de suplementação para aumentar os níveis de creatina no cérebro ainda não está claramente definida. A heterogeneidade nos protocolos de estudo, incluindo técnicas de avaliação da creatina cerebral, doses de suplemento e duração da intervenção, dificulta comparações diretas entre estudos. Apesar disso, a literatura sugere possíveis aumentos na creatina e PCr cerebral após a suplementação, embora em menor escala do que os observados no músculo. Resultados preliminares indicam que a suplementação de ácido guanidinoacético (GAA), um precursor da creatina, pode ser mais eficaz do que a creatina em aumentar o conteúdo de creatina no cérebro.  Essa descoberta destaca a necessidade de pesquisas adicionais sobre estratégias alternativas para aumentar a creatina cerebral, considerando a capacidade intrínseca do cérebro para sintetizar creatina e suas limitações na absorção desse composto através da barreira hematoencefálica. Creatina e o Desempenho Cognitivo Diversos estudos indicam que a creatina pode ter efeitos mais pronunciados em condições estressantes, como hipóxia e privação de sono combinada com exercícios. A controvérsia em relação aos resultados reflete as complexidades envolvidas na pesquisa, incluindo diferenças nas populações estudadas, nos testes cognitivos aplicados e nas dosagens e duração da suplementação. Há indicações de que processos cognitivos mais complexos podem ser mais suscetíveis aos benefícios da creatina, mas a variabilidade nos resultados dificulta conclusões definitivas. No contexto de idosos, os estudos apresentam resultados conflitantes. Alguns apontam melhorias no desempenho cognitivo, enquanto outros consideram a creatina ineficaz.  A falta de avaliações diretas da concentração de creatina no cérebro e as diferenças nos protocolos de suplementação utilizados são questões que levantam dúvidas sobre a eficácia da creatina nesse grupo. A resposta à suplementação de creatina pode variar entre vegetarianos e carnívoros. Embora alguns estudos sugiram melhorias na função cognitiva em vegetarianos após a suplementação, a falta de grupos de controle adequados limita as conclusões. Além disso, a pesquisa revela concentrações comparáveis de creatina cerebral entre vegetarianos e carnívoros, questionando a teoria de que os vegetarianos respondem melhor devido à menor creatina cerebral pré-suplementação. Para atletas, a creatina também pode desempenhar um papel relevante, especialmente em atividades que envolvem controle motor, tomada de decisão e coordenação. A suplementação de creatina tem sido associada à atenuação da fadiga mental em situações estressantes, como privação de sono, mas a relação direta com o desempenho esportivo específico ainda precisa ser completamente elucidada. Existe um potencial para a suplementação de creatina melhorar o processamento cognitivo,  especialmente em condições caracterizadas por déficits de creatina no cérebro, que podem ser induzidos por estressores agudos  (por exemplo, exercício, privação de sono) ou condições patológicas crônicas (por exemplo, deficiências da enzima de síntese de creatina, mTBI, envelhecimento, doença de Alzheimer, depressão). No entanto, permanecem pelo menos três lacunas principais. Primeiro, é importante determinar o protocolo ideal de creatina capaz de aumentar os níveis de creatina no cérebro. Em segundo lugar, são necessários estudos de suplementação que avaliem concomitantemente os níveis de creatina cerebral e a função cognitiva, pois podem ajudar a estabelecer a causa do efeito da suplementação de creatina na cognição. Terceiro, a identificação de novas condições nas quais a suplementação de creatina pode ser mais eficaz na melhoria da função cognitiva é justificada, uma vez que a creatina num cérebro saudável e descansado demonstrou ter um efeito diminuído. Prática Clínica Para o tratamento de desordens cerebrais, alguns estudos recomendam o uso diário de 10g de creatina, com resultados observados após aproximadamente 40 dias, sendo preferível a suplementação durante as refeições. Os nutricionistas têm à disposição três protocolos para a prescrição de creatina: 20g de creatina nos primeiros 5-7 dias; 3g de creatina por 20 dias; 3-5g de creatina por 21 dias. Anteriormente, acreditava-se que o primeiro método fosse o mais eficaz para saturar o músculo esquelético, mas hoje sabe-se que todas as três formas atuam com esse propósito. Continue Estudando… Sugestão de leitura:   Creatina na Saúde Mental da Mulher Sugestão de leitura:   Creatina: Intestino e Cérebro Sugestão de leitura:   Creatina e Cérebro: O que a literatura traz?  Referências Bibliográficas ROSCHEL, Hamilton; GUALANO, Bruno; OSTOJIC, Sergej M.; RAWSON, Eric S.. Creatine Supplementation and Brain Health . Nutrients , [S.L.], v. 13, n. 2, p. 586, 10 fev. 2021. MDPI AG.