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Disbiose como gatilho para a inflamação

Brunno Falcão

3 min

26 de nov. de 2021

A microbiota intestinal é um ecossistema que age de forma simultânea e mútua com as células do hospedeiro por um processo de simbiose, no qual nenhum dos dois é prejudicado. Existe uma relação de aspecto benéfico entre hospedeiro e microbiota, sendo fundamental o equilíbrio que favoreça as duas partes. As bactérias que integram o TGI são em sua maioria anaeróbicas, destacando-se os gêneros bacteroides (Bifidobacterium, Eubacterium, Clostridium, Peptococcus, Peptostreptococcus, Ruminococcus e Fusobacterium). A microbiota intestinal possui funções bem estabelecidas, como proteção contra o crescimento excessivo de patógenos, regulação de funções endócrinas intestinais, imunomodulação, sinalização neurológica e como fonte de biogênese energética e vitamínica. Naturalmente, a microbiota realiza o papel de barreira fisiológica, que é composta pelo epitélio da mucosa do intestino, localizado entre a luz intestinal e o espaço peritoneal. A estrutura intestinal é revestida por uma barreira protetora que atua como mecanismo de defesa contra patógenos, o que promove controle do que será absorvido devido a uma junção celular intestinal efetiva promovida pela barreira mucosa. O afrouxamento das junções celulares promove o desalinhamento e afastamento das células, e a condição digestiva é comprometida, o que aumenta a exposição do organismo a desarranjos intestinais, como inchaço, gases e alergias alimentares. Essas alterações, por outro lado, também podem elevar o estresse oxidativo e reduzir a regulação da absorção e transporte de nutrientes, síntese de aminoácidos, vitaminas e neurotransmissores. A microbiota intestinal é uma fonte de produção de Padrões Moleculares Associados a Patógenos (PAMPs) e outros metabólitos. A disbiose por si só não resulta necessariamente em inflamação sistêmica, no entanto, é frequentemente associada a um aumento de microrganismos que podem se tornar prejudiciais e desencadear inflamação local e sistêmica, conhecidos como patobiontes. A contenção da microbiota intestinal pelo sistema imunológico intestinal é crucial para a prevenção de doenças crônicas e inflamação sistêmica. De todos os sistemas orgânicos do corpo, o sistema imunológico pode ser o mais difícil de coordenar. Ele abrange uma alta quantidade de células imunes individuais, agregadas, tecidos imunitários e órgãos imunológicos. Este modo de organização estrutural torna o sistema capaz de responder rápida e eficazmente para qualquer corpo que não seja percebido como próprio do organismo. Funcionalmente, uma grande variedade de substâncias é utilizada para transmitir mensagens, instruções, e geralmente permite que bilhões de células imunes se comuniquem umas com as outras. Os PAMPs se comunicam com o hospedeiro induzindo respostas imunológicas que envolvem receptores intestinais de reconhecimento de padrões ligados à membrana (PRRs), como receptores Toll-like (TLRs), receptores tipo NOD ou receptores semelhantes a RIG-I33. Indivíduos saudáveis ​​são caracterizados por uma composição diversa da microbiota intestinal e uma barreira intestinal intacta, o que impede a penetração e disseminação sistêmica de bactérias e seus mediadores. Em contraste, a disbiose, com aumento da diversidade de bactérias patogênicas e sua translocação, inicia a produção de substâncias inflamatórias. O reconhecimento de moléculas microbianas características ativa vias de sinalização pró-inflamatória, como a do fator nuclear kappa B (NF-kB), que desencadeia a produção de citocinas pró-inflamatórias. Vários mecanismos inatos de defesa podem desempenhar um papel na regulação da homeostase intestinal e contribuir para o controle da reação inflamatória na lâmina própria. Os metabólitos do ácido araquidônico, chamados de eicosanoides são sintetizados por duas principais classes de enzimas: as cicloxigenase (prostaglandinas e tromboxanos) e as lipoxigenases (leucotrienos e lipoxinas). Os metabólitos gerados pela via da ciclo-oxigenase-2 (COX-2), por exemplo, parecem ser moduladores essenciais da resposta intestinal aos antígenos da alimentação. A COX-2 é expressa por células epiteliais intestinais e macrófagos. A atividade enzimática resulta na produção de metabólitos como o PGE2, que possui atividades imunomoduladoras, como a regulação negativa de antígenos do MHC de classe II e a indução da produção de IL-10. A colonização da mucosa intestinal por um patógeno, portanto, pode resultar em dano celular e, assim, iniciar uma resposta inflamatória para eliminar o agente nocivo. Já a microbiota comensal não induz resposta defensiva epitelial, mas exerce modulação imunológica no hospedeiro. Portanto, a colonização microbiana e a infecção intestinal podem influenciar diretamente o status de elementos celulares e humorais específicos e inespecíficos do sistema imunológico da mucosa intestinal. Referências: KIDD P. Th1/Th2 balance: the hypothesis, its limitations, and implications for health and disease. Alternative medicine review: a journal of clinical therapeutic, v. 8, n. 3, 2021. Disponível em: . SCHIFFRIN, EJ; BLUM, S. Interactions between the microbiota and the intestinal mucosa. European Journal of Clinical Nutrition, v. 56, n. S3, p. S60–S64, 2002. Disponível em: . CEBRA, John J. Influences of microbiota on intestinal immune system development. The American Journal of Clinical Nutrition, v. 69, n. 5, p. 1046s1051s, 1999. Disponível em: . TILG, Herbert; ZMORA, Niv; ADOLPH, Timon E.; et al. The intestinal microbiota fuelling metabolic inflammation. Nature Reviews Immunology, v. 20, n. 1, p. 40–54, 2019. Disponível em: .