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Fertilidade Humana e Influência do Sono

Brunno Falcão

4 min

13 de abr. de 2023

De acordo com pesquisas, há uma diminuição gradual na capacidade reprodutiva de casais ao redor do mundo. Isso pode ser explicado pelo fato de que os casais estão começando a tentar ter filhos em idades mais avançadas, quando a fertilidade natural já está em declínio. Assim como, é bem estabelecido que a idade avançada da mulher tem um impacto negativo nas chances de engravidar, enquanto os efeitos prejudiciais da idade avançada do homem no casal estão sendo cada vez mais reconhecidos. Além disso, observa-se um aumento gradual na incidência de infertilidade masculina, o qual tem sido associado a uma redução progressiva na quantidade e qualidade do esperma. Nesse contexto, os padrões de sono e a sua desregulação devem ser considerados como um dos fatores do estilo de vida que podem afetar a fertilidade. Table of Contents Toggle Fisiologia do Sono Alteração na Secreção de Melatonina Disfunção Circadiana Desregulação da Resposta Inflamatória Prática Clínica Referências Bibliográficas Fisiologia do Sono Nos mamíferos, a vigília é um momento de gastar energia e maximizar a produção reprodutiva, enquanto o sono é essencial para otimizar a alocação de energia, repondo os déficits acumulados durante o estado de vigília e preparando o organismo para o próximo período de atividade. Além disso, o sono desempenha um papel fundamental na manutenção da homeostase celular, anabolismo, função imunológica adequada e plasticidade neural normal. Existem vários padrões de sono diferentes, cada um com seus próprios estágios distintos. As fases de movimento não-rápido dos olhos (NREM) são comuns a todos os animais e são caracterizadas por uma desaceleração no eletroencefalograma (EEG) cortical, resultando em um estado de imobilidade geral, respiração regular e frequência cardíaca estável, reduzindo a produção de calor metabólico. Por outro lado, o sono de movimento rápido dos olhos (REM) apresenta uma atividade cortical aumentada no EEG, acompanhada de atonia muscular esquelética generalizada com espasmos musculares intermitentes nas extremidades distais, ereções penianas ou clitorianas e aumento da variabilidade respiratória e cardíaca. Nos seres humanos, é essencial dormir de sete a oito horas diárias para manter e restaurar a homeostase metabólica do corpo. Crianças e adolescentes precisam de mais sono do que adultos, enquanto adultos jovens precisam de mais sono do que os mais velhos.  Destaca-se ainda que o ciclo fisiológico do sono-vigília é controlado por vários reguladores circadianos que são modulados no nível hipotalâmico, sendo a entrada de luz o principal fator que sincroniza o ritmo circadiano, bem como os estímulos serotoninérgicos que regulam o tempo circadiano por meio de uma série de loops de feedback de transcrição/tradução positivos e negativos interligados. Alteração na Secreção de Melatonina A literatura mostra que há uma conexão bidirecional entre os ritmos circadianos e as funções reprodutivas, e que essa conexão é finamente regulada por um sistema de feedback circular. Hormônios sexuais, como andrógenos, estrogênios e progesterona, podem afetar o centro da homeostase circadiana. Além disso, distúrbios externos no ritmo circadiano têm sido associados a mudanças nos níveis de hormônios reprodutivos. O relógio circadiano principal se comunica fisiologicamente com a glândula pineal por meio da liberação regular de melatonina, que é crucial para manter os ritmos circadianos e as suas manifestações físicas, como os cronotipos. Se a regularidade da melatonina for interrompida, essa conexão nervosa falhará e a homeostase circadiana será afetada.  Portanto, a melatonina tem sido apontada como um importante componente na regulação da fisiologia reprodutiva humana, devido às suas propriedades antioxidantes e sua capacidade de regular os hormônios. Exemplificando, por meio do aumento da produção das enzimas antioxidantes, como glutationa peroxidase, superóxido dismutase e catalase, a melatonina tem propriedades que permitem melhorar a qualidade do oócito e apoiar a fase folicular em camundongos fêmeas. Uma meta-análise constatou que o grupo que recebeu tratamento com melatonina apresentou uma maior recuperação de oócitos maduros. No entanto, não houve diferença na taxa de gravidez clínica entre os grupos analisados. Ainda, apesar de ser evidente o papel prejudicial da falta de melatonina na reprodução feminina, não há clareza sobre o efeito de seu excesso. As evidências sobre o excesso de melatonina são limitadas, mas sugerem que pode induzir amenorreia e hipogonadismo em mulheres. Outrossim, a melatonina apresenta efeitos antioxidantes e anti-inflamatórios nos tecidos testiculares, além de modular a secreção do hormônio liberador de gonadotropina. Estudos recentes também demonstraram propriedades anti-apoptóticas mediadas pela melatonina, o que resulta em uma redução na fragmentação do DNA do esperma e na peroxidação lipídica. Disfunção Circadiana Existe uma possível base genética para a relação entre fertilidade e cronótipos. Além do controle central da atividade circadiana, mecanismos periféricos do relógio foram encontrados na maioria dos tecidos corporais, como no útero, testículos e embrião. Esse perfil sugere que o ciclo circadiano pode ter um papel na regulação da reprodução em mamíferos.  Com isso, os dados indicam que a disfunção circadiana causada por distúrbios do sono e desregulação dos genes do relógio e da melatonina pode afetar negativamente a fertilidade. No entanto, ainda não está claro se essa disfunção pode contribuir para a diminuição global da fertilidade observada. Desregulação da Resposta Inflamatória Uma conexão potencial entre o sono e a fertilidade é através da estimulação da resposta inflamatória. Em alguns distúrbios do sono, perfis anormais de citocinas são detectados, evidenciando níveis elevados de proteína C reativa de alta sensibilidade, fator de necrose tumoral, interleucina (IL)-1, IL-6 e IL-8.  Por outro lado, dados mostram que pacientes inférteis apresentaram níveis mais elevados de IL-6 e TNF-α em comparação com indivíduos férteis. Dessa forma, é sugerida uma possível associação entre inflamação e infertilidade, com base na associação do envolvimento do sistema imunológico com abortos recorrentes, pré-eclâmpsia e parto prematuro. Prática Clínica Existem vários mecanismos fisiopatológicos que foram propostos para explicar a relação entre o sono e a fertilidade humana. No entanto, apesar de se assumir que os distúrbios do sono possam afetar negativamente a saúde, incluindo a saúde reprodutiva, ainda não existe evidência clara sobre o impacto clínico da desregulação do sono. Portanto, mais estudos abordando o tema são necessários.  Referências Bibliográficas Sugestão de leitura:  Magnésio e Sono: Há relações? Assista o vídeo na Science Play com Jefferson Bitencourt: Distúrbios do sono e marcadores bioquímicos Artigo distúrbios do sono : Spaggiari G, Romeo M, Casarini L, Granata ARM, Simoni M, Santi D. Human fertility and sleep disturbances: A narrative review. Sleep Medicine. 2022;98:13-25. doi:https://doi.org/10.1016/j.sleep.2022.06.009 Classifique esse post #saudedamulher #sono #sonoefertilidade #fertilidade #ciclocircadiano