Qual efeito epigenético do leite materno no neurodesenvolvimento?
Brunno Falcão
3 min
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3 de jan. de 2024
Antigamente, a comunidade científica acreditava que a saúde de uma pessoa era determinada apenas pelo genoma individual, sem influência externa. A hipótese de Barker, porém, conectou baixo peso ao nascer e más condições pré-natais às doenças adultas. Assim, a hipótese das Origens Fetais de Doenças Adultas (FOAD) afirma que o genoma fetal tem plasticidade de desenvolvimento, permitindo que fatores estressantes, como privação de leite materno, modifiquem o genoma para condições adversas. Além disso, a FOAD sugere que exposições ambientais precoces, pré e pós-natal, influenciam permanentemente a saúde e a predisposição a doenças na vida adulta. Isso envolve mudanças hereditárias na expressão gênica mediadas por modificações epigenéticas, como metilação de DNA, modificação de histonas e ativação ou silenciamento de genes associados a RNAs não codificadores. Esses mecanismos epigenéticos desempenham um papel crucial na programação do desenvolvimento. Tabela de conteúdos: Leite materno e saúde do bebê Leite materno e neurodesenvolvimento Prática clínica Referências Leite materno e saúde do bebê Fatores maternos estressantes, como obesidade ou desnutrição, tabagismo e diabetes, entre outros, são conhecidos por desencadear modificações epigenéticas na descendência. Ademais, a maioria do desenvolvimento humano ocorre nos primeiros 1000 dias, sendo um período crítico na determinação do desenvolvimento futuro e da saúde. Por outro lado, após o nascimento, o leite materno humano é reconhecido por reduzir a probabilidade de expressão de uma ampla variedade de doenças não transmissíveis. O leite materno pode modificar os mecanismos epigenéticos dos bebês e influenciar sua saúde intergeracionalmente. Assim, há uma hipótese de que o leite materno promova modificações epigenéticas por meio de seus componentes bioativos, como fatores de crescimento, microbiota, células-tronco, micro-RNAs (miRNAs) e longos RNAs não codificadores (lncRNAs) . Além disso, estudos também demonstraram que o aleitamento materno está associado a melhores resultados neurodesenvolvimentais em bebês nascidos a termo e prematuros. Leite materno e neurodesenvolvimento Os mecanismos subjacentes que explicam as conexões entre o consumo de leite materno e os resultados neurodesenvolvimentais ainda não foram esclarecidos completamente. Acredita-se que os efeitos epigenéticos do aleitamento possam mediar associações entre amamentação e desenvolvimento cerebral. Pesquisas recentes sugerem que o consumo de leite materno da própria mãe durante a hospitalização de bebês com peso muito baixo ao nascer pode influenciar as mudanças nos padrões de metilação do DNA de genes associados ao neurodesenvolvimento até os 5,5 anos de idade. Essas variações na metilação estão correlacionadas a diferenças na estrutura cerebral e no quociente de inteligência (QI). Além disso, o leite materno contém uma abundância de micro-RNAs, pequenas moléculas de RNA que desempenham papéis cruciais no desenvolvimento neural. Esses miRNAs, juntamente com lncRNAs e células-tronco, podem contribuir para os efeitos benéficos desse alimento no neurodesenvolvimento. Além disso, o microbioma do leite materno, que colonizam o intestino do bebê, provavelmente compartilha efeitos semelhantes sobre o neurodesenvolvimento do bebê. As conexões entre o aleitamento materno e o neurodesenvolvimento estão se tornando cada vez mais claras, com a epigenética desempenhando um papel fundamental nessa complexa relação entre as experiências precoces da vida e as consequências duradouras na saúde de bebês nascidos a termo e prematuros. Prática clínica O entendimento das ligações entre a amamentação materna, a epigenética e o desenvolvimento neurológico está se tornando cada vez mais relevante. É fundamental promover e apoiar a amamentação, especialmente em bebês nascidos prematuramente ou com baixo peso ao nascer, como uma estratégia para melhorar os resultados de saúde a longo prazo. O conhecimento das modificações epigenéticas associadas à amamentação materna pode orientar abordagens terapêuticas e preventivas mais eficazes, visando reduzir o risco de distúrbios neurológicos e outras doenças não transmissíveis na vida adulta. Além disso, a conscientização sobre os benefícios da amamentação para o desenvolvimento cerebral pode incentivar mães e famílias a optar pelo aleitamento materno exclusivo sempre que possível. Referências Sugestão de estudo: Qual a real composição do leite materno? Assista o vídeo na Science Play com Renata Bagarolli: Reprogramação materno fetal GIALELI, Giannoula; PANAGOPOULOU, Ourania; LIOSIS, Georgios; SIAHANIDOU, Tania. Potential Epigenetic Effects of Human Milk on Infants’ Neurodevelopment. Nutrients , [S.L.], v. 15, n. 16, p. 3614, 17 ago. 2023. MDPI AG.